domingo, 30 de outubro de 2016

A Casa ao Lado (Uma nova pista)



Dona Lúcia, por sua vez, vivia às voltas do caso. Tentava obter as informações com seu conhecido, funcionário da delegacia. Se seu Joaquim era inocente e a arma encontrada em sua casa não matara o jovem, então por quê, d. Gertrudes dera a entender que escondera algo na casa dele?

A polícia continua a investigação e descobre após o depoimento do casal, Luiz e Célia, o envolvimento do Elias no tráfico de drogas. O casal conhece-o como José, porém, através do retrato falado, a verdadeira identidade dele é descoberta. A hipótese dele ser o assassino ou mandante do assassinato é levantada.

Não demora muito para descobrirem seu paradeiro. Ele é trazido de volta, dessa vez, escoltado pela polícia.
Em seu depoimento, alega que tinha viajado porque temia que seu envolvimento com o casal viesse à tona. Confessou que pensou em acabar com a vida do rival, mas não matando-o. Queria que ele se afundasse mais e mais no vício e que acabasse tendo uma overdose. Assim não sujaria suas mãos apertando o gatilho. Seu crime era o tráfico, era culpado e pagaria por isso. Sabia que seu advogado o defenderia e ele não ficaria muito tempo na penitenciária. Por mais que amasse a Eloísa não mataria por ela. Até cogitou a ideia de pagar alguém para fazer o serviço, por fim acabou desistindo. Não pretendia carregar aquela culpa. Seria melhor se Roberto acabasse com a própria vida.

O caso estava se tornando complicado. Quando a polícia pensava que tinha uma nova pista sobre o assassino, se deparava com as faltas de evidências para incriminá-lo. Ficaria esse crime sem solução como tantos outros por este mundo a fora? D. Lúcia estava desesperada. A desconfiança entre a vizinhança era assustadora. Se o assassino não era o Elias, provavelmente, era algum morador do bairro. Ela pensara na Gertrudes, depois de ter ouvido a conversa dela com o marido, porém, a arma do crime não era aquela encontrada na casa do seu Joaquim. Resolveu, então, agir novamente, por sua conta.

Numa manhã de domingo, aproveitando a tranquilidade da rua, ela levantou antes do marido e deu um jeito de entrar na casa ao lado, onde o crime aconteceu. Conseguiu arrombar a porta dos fundos. Já tinha assistido alguns filmes e aprendera os macetes. A polícia já havia revistado todos os cômodos. Por onde começaria? Será que a polícia deixara passar algum canto sem a devida revista? De repente, pensou nas crianças que dormiam tranquilamente, enquanto o crime acontecia na sala. Ela estava a par de todas as informações.
Foi olhando tudo a sua volta até que descobriu o quarto das crianças. Usando luvas como da outra vez, revirou os armários, debaixo dos colchões e a prateleira de brinquedos. E lá, no fundo de uma caixa, entre alguns joguinhos, estava uma arma parecida com aquela encontrada na casa do seu Joaquim. Certamente a polícia não procurou direito. Era o lugar menos provável da casa. As crianças estavam dormindo, quem entrou ali para esconder a arma, foi rápido e eficiente.
A arma era idêntica a outra. O que a diferenciava? Bom, ela não entendia nada de armas. Deixaria por conta da polícia. Saiu dali e foi para casa pensando no que faria. Passou o resto do dia com a cabeça nas nuvens. Ainda bem que seu marido era distraído e não percebeu seu comportamento.
No dia seguinte, pela manhã, foi ao orelhão. Ligou para seu conhecido, aquele que trabalha na delegacia e contou a ele o que tinha feito.
- Alô, tudo bem? Preciso te contar uma coisa, mas quero que ouça com atenção e não pronuncie meu nome. Ontem, acordei pensando na morte daquele rapaz e, tive a ideia de dar uma olhada no local do crime. Consegui entrar na casa e vasculhei os cômodos. Sei que a polícia já fez isso, porém, pensei que poderia ter deixado escapar algum detalhe. Pois bem, encontrei um revólver dentro de uma caixa de brinquedos no quarto das crianças. E não é de brincadeira.
- Entendi e agradeço pela informação. Não se preocupe, manterei sigilo sobre esta conversa. 

D. Lúcia sentiu-se aliviada. Certamente em breve a polícia resolveria aquele caso e a paz reinaria novamente no seu bairro e principalmente, na sua rua. Antes de voltar para casa foi dar uma caminhada pelo quarteirão, enquanto pensava na sua descoberta. A cena do crime passava pela sua mente. Imaginava o assassino saindo sorrateiramente da sala, após o tiro, e indo esconder a arma no quarto das crianças que dormiam como anjos. Em seguida ele volta para sala e ninguém percebe seus movimentos. Os convidados estão abalados, em estado de choque, com aquele corpo caído no chão. Ele age naturalmente e quando a polícia chega, atendendo a denúncia anônima, não desconfia que o criminoso está ali na sala.

Passando em frente à casa do seu Joaquim, d. Lúcia ouve um gemido e bate na porta. O vizinho, moribundo, consegue chegar à porta e assim que a abre, cai desfalecido. D. Lúcia corre e grita pelo marido que estava na área da frente, esperando por ela.

Será que d. Lúcia e o marido conseguirão salvar o pobre homem?

Aguarde o próximo capítulo para saber mais detalhes sobre a história!!
Seu comentário é muito importante para mim.

Obrigada pela visita!
Um abraço,
Cidália.
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quarta-feira, 26 de outubro de 2016

A Casa ao Lado (Dúvidas e segredos)





Na mercearia, d. Gertrudes voltou a conversar com o marido sobre a arma que escondera na casa do seu Joaquim.

- Eu pretendia matar aquele patife que acabou com a vida da nossa filha. Nem que passasse o resto da vida na prisão. Naquele momento não estava pensando nas consequências.
- Minha querida, ainda bem que você foi esperta e não deixou as digitais na arma. Senão você já teria sido pega.
- Pensei em tudo direitinho, agi com prudência e você sabe que não fui eu quem apertou o gatilho. Havia mais alguém querendo a morte daquele rapaz. Alguém que chegou na minha frente.
- Como você vai provar se descobrirem que estava lá?
- O tiro que acertou o moço saiu antes que eu chegasse à sala. Dei meia volta e saí de fininho.
- Por que a arma que estava na casa do seu Joaquim, a minha arma, foi identificada como a arma do crime?
- Querido, você está achando que fui eu e que estou mentindo? Se eu fosse a culpada não iria guardar segredo para você. Tive a ideia de esconder a arma na casa do nosso vizinho, dois dias depois, porque percebi os olhares atravessados dele, cada vez que me encontrava. Pensei que ele tinha me visto naquela casa na hora do tiro.
- Você tinha me contado essa história pela metade outro dia. Ficou de continuar numa outra oportunidade e acabou esquecendo.
- Pois é, você não tocou mais no assunto, pensei que não estivesse interessado. O que importa é que estou contando agora. Aproveitei o momento em que ele saiu para caminhar, de manhãzinha, para entrar na casa dele e esconder a arma. A rua estava deserta. Você e os vizinhos ainda dormiam.
- Coitado do homem! Quando será que a polícia vai descobrir a verdade?
- Eles não devem ter feito o exame de balística e quando fizerem seu Joaquim será inocentado.
- Mulher, porque você não conta a sua versão à polícia? Você não poderá ser incriminada só porque a arma é minha.  Assim a polícia apressará o exame, libertará aquele inocente e irá atrás do verdadeiro culpado.
- Não quero me envolver mais do que já estamos envolvidos. Já é do conhecimento da vizinhança que nossa filha era namorada daquele rapaz. Sem contar que a arma era sua. Ainda bem que você tinha feito o boletim de ocorrência na época em que ela foi roubada.
- Você acabou de dizer que o tiro não partiu da minha arma. É só uma questão de tempo, então, para a verdade aparecer. Não é justo aquele senhor pagar por um crime que não cometeu. Ele é inocente! Não estou aguentando guardar esse segredo. O remorso está me corroendo por dentro.
- Vamos esperar um pouco mais. Assim que o resultado sair, você vai ver que estou com a razão. A polícia se concentrará na busca do assassino e da arma. Não precisamos nos expor, querido.
- Preste atenção no que vou falar, se dentro de duas semanas, seu Joaquim não for liberado, vou me oferecer para depor a favor dele.
- E se te acusarem de cumplicidade? Você terá que explicar porque demorou para falar o que sabia, Antônio e eu serei indiciada por omissão dos fatos. Poderíamos ter evitado a prisão do nosso vizinho, porém, eu ficaria presa até a conclusão da investigação.

O casal que já estava passando por uma crise por causa da filha, chegara ao limite. D. Lúcia havia percebido que o clima entre os dois estava diferente. Ela roía as unhas de tanta curiosidade, desde o dia em que ouvira a conversa entre os dois. Qual o segredo que ambos escondiam? Pensou em dar mais um telefonema anônimo à polícia, porém acabou desistindo. Seu marido exigira que ela não se metesse naquele caso. Já tinha se metido uma vez. Não queria contrariá-lo.
A polícia constatou, após o exame de confronto balístico, que o revólver calibre 38, encontrado na casa do seu Joaquim, não havia causado a morte do jovem Roberto. A dúvida que permanecia era o motivo de alguém esconder a arma na geladeira da casa dele. Quem e por quê faria isso? Uma hora ou outra tudo seria esclarecido.

Sem provas contra ele, aquele senhor não podia continuar preso. Seu Joaquim foi liberado, pois o único delito cometido foi seguir o Roberto, quando descobriu que era o namorado da Eloísa. No dia que o seguiu, pegou-o passando algo na frente de uma escola, para um adolescente. Jamais pensou em matar alguém, muito menos aquele rapaz. Entendera que a moça era comprometida. Achou melhor deixar para lá o dinheiro que tinha emprestado a ela. Nem sabia que o jovem estava lá, naquela casa, naquele dia fatídico.
Tudo o que seu Joaquim esperava era que a moça não contasse à família que ele a importunara. Se isso acontecesse teria que ir embora dali. Não suportaria ser apontado como "velho safado" pelos vizinhos.
De volta a sua casa se fechou no seu mundinho. Estava arrependido da sua atitude com a Eloísa. Ela não era uma qualquer. Era moça de família. Precisava de conselhos, de ajuda e o que ele fez? Tentou tirar proveito da situação. Perdera a cabeça!
Talvez a melhor coisa a fazer, seria ir embora daquele bairro. A tristeza e o arrependimento pelo que fizera à moça e mais a lembrança dos dias que passara na prisão, injustamente, povoavam-lhe a mente e ele não conseguia dormir. A insônia era a sua companheira, noite após noite.
Em pouco tempo a depressão o arrematou. Sem comer, sem conversar com ninguém e sem dormir, ficou a espera da morte. Os vizinhos, até mesmo aqueles que sempre acreditaram na sua inocência, viraram-lhe às costas.

D. Lúcia até sentira a sua falta, mas tinha vergonha de procurá-lo depois de entregá-lo à polícia. O marido dela, era o tipo de pessoa que preferia ficar na dele. Não queria se envolver com nada. Sentia saudades da monotonia que havia no bairro antes daquele casal se instalar na casa ao lado da sua.

Seu Joaquim estava no lugar errado, na hora errada e acabou se dando mal. Foi acusado injustamente e abandonado pelos vizinhos.

Será que d. Gertrudes merece perdão pelo que fez com o pobre homem?

Em breve mais um capítulo, não deixe de dar a sua opinião, obrigada!

Abraços,
Cidália

domingo, 23 de outubro de 2016

A Casa ao Lado (Mente diabólica?)

Depois de algum tempo a polícia descobriu o envolvimento do Roberto com a droga e passou a investigar a sua vida e a ligação com o tráfico. Já era do conhecimento da polícia o relacionamento dele com a filha dos donos da mercearia.

Seu Joaquim continuava preso aguardando o julgamento. Seu advogado corria atrás de provas que o inocentassem. Ele confessou que assediou  Eloísa e que chegou a molestá-la. Emprestara dinheiro a ela e queria que a dívida fosse paga com carinhos. Tinha se apaixonado pela moça.

Eloísa respondeu ao assédio com desdém. Cuspiu no seu rosto e o chamou de velho babão. Prometeu que pagaria a dívida assim que tivesse algum dinheiro. Sentiu nojo daquele homem que tinha idade para ser seu avô. Arrependeu-se de ter recorrido a ele num momento de desespero.

Em seu depoimento, seu Joaquim disse que não sabia que o jovem assassinado era namorado da Eloísa. Ele estava lá naquela madrugada por pura curiosidade. Chegara a pensar que era um cabaré. Quem sabe, encontraria uma mulher que se interessasse por ele?

Com a polícia investigando a vida do Roberto e dona Lúcia bisbilhotando os vizinhos, os dias passavam lentamente. Na casa ao lado o silêncio causava estranheza aos moradores que passaram meses sem dormir direito. Todos esperavam que tudo se resolvesse o mais rápido possível.

Elias, sabendo da investigação, resolveu sumir por uns tempos, antes que descobrissem seu envolvimento com o casal (Luiz e Célia). Viajou para casa de um parente que morava no sul do país. Ficaria por lá até a poeira abaixar.

D. Gertrudes foi visitar a filha algum tempo depois, da morte do Roberto. Precisava contar a ela o que tinha acontecido.
Quando chegou à clínica, a primeira coisa que a filha quis saber foi notícia do rapaz.

- Mãe, você viu o Roberto? Ele respondeu a minha carta?
- Minha filha, eu e seu pai estamos com saudades. Você não quer saber como seu pai está?

- Se meu pai estava com saudade, porque não veio me ver até agora?
- Porque ele precisa trabalhar. De onde você acha que vem o dinheiro para pagar esta clínica?

- Eu não queria ter vindo para cá. Por mim, estaria morando com o Roberto, nem que fosse debaixo da ponte.
- Você é mal agradecida, eu e seu pai queremos o seu bem. E quer saber de uma coisa? Não entreguei a sua carta. Aquele rapaz está morto, foi assassinado!

- Não acredito, você está mentindo mamãe. O Roberto é um bom moço, não tem inimigos.
- Você é que pensa! Está cega e não vê que nesse mundo onde vocês se meteram não tem amigos, só há interesse.

- Eu e o Roberto temos muitos amigos, sim.
- E onde estão esses amigos? Ninguém foi te procurar até agora. Não devem ter sentido a sua falta!

- Quero sair daqui, preciso ver o Roberto. Me leva com você, mamãe. Prometo que me comportarei. Farei tudo o que a senhora quiser.
- Aquele rapaz está morto, acredite minha filha. A polícia está investigando a morte dele e logo chegará até você. É melhor que continue aqui.

- Mas, por quê alguém o mataria? Ele nunca prejudicou ninguém.
- Como vou saber? Ele devia estar metido em alguma coisa que você não sabia. Existe muita maldade por aí. E se ele fosse um bom rapaz não a teria desviado do bom caminho.

A hora de visita chegou ao fim e d. Gertrudes se despediu da filha com um forte abraço. Prometeu que voltaria em breve com mais notícias. Levaria um jornal para que a filha pudesse acreditar nela. Saiu daquele quarto com o coração oprimido. Era muito triste ver a filha naquele estado desolador.

Eloísa ficou aos prantos. Passou a noite chorando e teve que ser medicada para se acalmar.

Será que tinha alguém com a mente tão diabólica, capaz de matar Roberto por causa da droga? Será que ele ficou devendo para alguém? Sabia que ele fazia algumas entregas de vez em quando, para conseguir dinheiro.

De repente, lembrou do Elias e sentiu um arrepio. Lembrou de suas cantadas e do fora que havia dado nele. Será que o Elias seria capaz de fazer alguma coisa contra seu namorado? Não, o Elias era somente um traficante. Nunca matara ninguém! Pelo menos era o que tinha ouvido falar a seu respeito.

Sua cabeça cheia com todos esses pensamentos. Eloísa se fechou ainda mais no seu casulo. Não quis comer e se recusou a sair do quarto. A imagem do namorado não saía da sua mente. Podia sentir o calor do seu abraço e o toque de suas mãos nas carícias mais ousadas.

O que seria dela quando saísse daquele lugar? Teria força para recomeçar sem a presença do seu amado? Roberto foi seu primeiro amor. Foi por ele que desistiu dos seus sonhos. Foi para agradá-lo que se entregou àquela vida desregrada.

Tantas perguntas sem respostas! Uma moça alegre, cheia de vida, cobiçada pelos rapazes, agora era apenas uma sombra, vagando pela escuridão do mundo que escolhera. Estava no fundo do abismo, sozinha.

Haverá esperança para ela? Só o tempo responderá todas essas dúvidas! 



Seja sempre bem vindo (a) e não deixe de ler o próximo capítulo!!

PS: Pensei que mudaria o layout do blog quando completasse um ano, mas o tempo voou e o blog continua com a mesma aparência.

Obrigada a todos os amigos que me acompanham desde então!! Amigos reais e virtuais, blogueiros e blogueiras que me apoiam.
 Um super abraço!!
Cidália.
 
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quarta-feira, 19 de outubro de 2016

Tarde ensolarada





Sentada na varanda, num dia lindo, de sol intenso, ela olha o movimento na rua. Espera que um daqueles transeuntes pare um pouquinho para conversar. São pessoas conhecidas que caminham em busca de algo. Espera ser notada por alguém, mas ninguém olha em sua direção.

As palavras estão presas na sua garganta e esperam ser jorradas, boca a fora, na primeira oportunidade. Esperar é o verbo mais conjugado naquela fase da sua vida. Muitas vezes a espera é longa, porém ela não desiste de esperar.

Espera pelo café todas as manhãs, pelo prato de comida na hora da refeição; espera pelo medicamento uma vez ao dia; espera por um afago, um sorriso, um estímulo. Espera pela visita das amigas, por um sorvete para refrescá-la naquele calor.

Enfim, espera por alguém que se interesse em dividir com ela os anos que lhe restam. Um companheiro da sua idade. Ainda sonha com passeios na praia, uma viagem de navio ou quem sabe de avião, e um jantar à luz de velas.

Os anos foram passando numa rapidez atordoante, que quando se deu conta já era uma anciã. As rugas não seriam nada se não sentisse sua alma envelhecida. Não estava caduca, disso tinha certeza. Apenas sentia um grande desânimo.

A juventude de outrora deixara saudades. Saudades de um grande amor, de momentos especiais, de uma vida bem vivida. Ela foi uma mulher ativa, decidida, resolvida que ao longo do tempo foi vencida pelo cansaço.

Cansaço mental, espiritual; que a deixa à mercê da ociosidade. Nada mais faz, além de ver o tempo passar sentada no degrau da sua varanda. Às vezes caminha até o final da rua para exercitar as pernas. Não tem hábitos de leitura, não faz nenhum artesanato e até a TV perdeu a graça.

De repente, os olhos brilham, o sorriso se faz presente naquele rosto, que um dia foi, tão sorridente. As amigas fazem-lhe uma surpresa após os abraços  prolongados. Entregam-lhe um pequeno embrulho de presente.

Um simples presente, uma foto delas, num encontro festivo. Uma foto num lindo porta-retratos que a deixa imensamente feliz. Ela se vê tão bonita entre as amigas, bem arrumada, ereta, posando para a câmera. Foi um momento especial, que guardará para sempre.

Durante aquela tarde, as palavras que estavam sufocadas na sua garganta são despejadas para fora, num ritmo acelerado. Ela precisa aproveitar aquele momento para extravasar os sentimentos que estão adormecidos dentro de si. O desânimo deu uma trégua!

Ali mesmo, sentadas sobre o degrau da varanda, as amigas colocam os assuntos em dia. Riem muito e aquela, que ansiava por aquele momento, satisfaz seu ego. Ela coloca para fora as mágoas e rancores que lhe afligem o peito. As amigas ouvem pacientemente e fazem-na sentir-se viva e disposta para o que der e vier.

Uma tarde que valerá por um bom tempo até a próxima visita. Agora ela poderá olhar aquela foto e saberá que as amigas estarão sempre pensando nela. Mesmo que não a visitem com frequência. Mesmo que os dias demorem para passar até que se reencontrem novamente.

Muitas tardes ensolaradas, com as amigas, virão para iluminarem a sua vida. O riso estampará sua face e seu coração transbordará de alegria, nem que seja apenas por algumas horas. Então, agradecerá a Deus!


Trecho da música: Amizade sincera (Fábio Jr.)

Os verdadeiros amigos
Do peito, de fé
Os melhores amigos
Não trazem dentro da boca
Palavras fingidas ou falsas histórias
Sabem entender o silêncio
E manter a presença mesmo quando ausentes
Por isso mesmo apesar de tão raros
Não há nada melhor do que um grande amigo.


Obrigada pela visita, abraços!

Cidália. 



 PS: Aguardem no domingo, mais um capítulo do conto "A Casa Ao Lado".





domingo, 16 de outubro de 2016

A Casa ao Lado (Como tudo começou)


Antes de se envolver com o mundo das drogas, Roberto era um jovem estudioso, bom filho, responsável e trabalhador. Deixou tudo isso para trás quando começou a sair com as pessoas erradas. Tornou-se rebelde, desobediente; começou a faltar na escola e no trabalho. Cometeu alguns furtos, foi preso e só causou desgostos à família. Perdeu o emprego e a dignidade. Apesar de tudo, seus pais jamais o abandonaram. Ele era o filho caçula, muito amado por todos. Sempre davam um jeitinho de justificar seus erros, de perdoá-lo.

O namoro com Eloísa poderia ter sido diferente se ambos não tivessem se metido naquela vida promíscua. Uma vida de drogas, bebidas e luxúria. O sentimento que os unia era uma paixão arrebatadora. Um tornou-se dependente do outro e mais ainda das drogas. Eloísa mantinha seu namoro escondido dos pais. Cada vez que saía de casa, dizia que ia se encontrar com os amigos. Sabia que eles não aprovariam aquele romance. Quanto à família do Roberto, também, ignorava o namoro dos dois.

Entre os inimigos de Roberto havia o Elias, que estava apaixonado por Eloísa. Era um traficante que fazia ponto no centro a cidade. Eloísa nunca dera atenção a ele, só tinha olhos para o Roberto. O fato da moça ignorá-lo só fez aumentar o ciúme do Elias. Cada vez que ele via o casal, sentia o ódio crescendo dentro do peito. Queria Eloísa a todo custo. Se Roberto saísse do seu caminho, ela aceitaria seu amor.

Os maus pensamentos foram se infiltrando na mente do rapaz. Pagaria alguém para dar um sumiço no rival. Seria fácil encontrar alguém para fazer o serviço sujo. Daria um tempo à Eloísa e depois a cercaria de todas as maneiras. Tinha certeza de que ela se interessaria por ele, afinal, era um bom partido. Ele era um traficante, não um assassino, porém o ciúme e a inveja estavam corroendo sua alma. Sentimentos ruins, antes nunca sentidos tinham brotado em seu peito.

Roberto começou a frequentar uma casa de jogos clandestinos no bairro onde os pais da Eloísa moravam, pouco tempo depois dela ser levada para a Clínica de Recuperação.
Numa dessas idas à casa de jogos, que era ao lado da casa da dona Lúcia, Roberto foi seguido por Elias.

Ao descobrir o que funcionava naquela casa, o traficante deu um jeito de se apresentar aos donos, marcando um encontro por telefone. Não foi difícil conseguir o número; naquele vilarejo as pessoas eram ingênuas. Bastava ser simpático e inventar uma pequena mentira.

Foi dessa forma que Elias, usando um nome falso, conheceu os donos daquela casa, num clube no centro da cidade. Com sua lábia, induziu o casal a "repassar" sua mercadoria. A porcentagem oferecida por ele foi tão significativa que o casal não hesitou.

Começou, naquele dia, o acordo entre Luiz, Célia e Elias, vulgo José. Nas festas que rolavam toda noite, o casal distribuía a mercadoria, aumentando assim sua renda. Os frequentadores, jovens da classe média, já estavam viciados muito antes de chegarem ali. Um amigo levava outro e a turma foi crescendo.

Célia e Luiz localizaram os amigos da época do colégio. Eles conheciam àqueles que se deixavam levar pelos outros, que tinham a mente fraca. Os jogos faziam parte do entretenimento. As crianças ficavam na sala até um certo horário, quando festejavam o aniversário de uma delas ou de um dos visitantes. Em seguida eram levados para o quarto, onde dormiam profundamente, após a ingestão de calmantes.

Quando a polícia apareceu pela primeira vez, por causa da denúncia feita pela dona Gertrudes, viu somente os jovens bebendo e dançando alegremente, como em todas as festas. Não notou nada de anormal e pediu que desligassem o som que estava incomodando os vizinhos. O casal atendeu o pedido e deu a festa por encerrada naquela noite. Era preciso manter as aparências para não levantar suspeitas.

Roberto era um dos convidados, estava ali quase todas as noites. Fazia algum tempo que não via a namorada. Ela tinha desaparecido sem dar notícias. Eloísa não chegara a dar o endereço a ele, sabia que seus pais não aprovariam o namoro. Preferia se encontrar com ele em outros lugares.

Mal sabia o Roberto, que a mãe da moça sabia da sua existência. Que ela tinha seu endereço e que guardara a carta com uma foto do rapaz. Sim, ela abrira a correspondência e além de ler, vira a foto dos dois que estava dentro.

Dona Gertrudes, uma mulher temente a Deus, passou a sentir raiva daquele homem que desencaminhou a sua amada filha. Aquele sentimento se instalara em seu coração de tal maneira que estava consumindo-a por dentro. Ela tinha um fio de esperança e sonhava com a recuperação da moça. Esperava que ela voltasse a ser como antes. Mal sabia essa mãe que a filha ainda escondia alguns segredos. Um deles era que havia emprestado dinheiro de um dos moradores da vizinhança.

Aquele bairro que era tão sossegado antes da chegada dos vizinhos da dona Lúcia, passou a ser manchete nos noticiários. Pessoas simples que levavam uma vida normal passaram a ser destaques nas notícias. Seu Joaquim continuava aguardando o término da investigação. A opinião dos vizinhos estava dividida. Alguns acreditavam na sua inocência e outros tinham lá as suas dúvidas.


Quem matou o jovem Roberto? Seu Joaquim, dona Gertrudes, o Elias ou nenhum deles?


Para facilitar o acompanhamento da trama,
 
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http://contosdacabana.blogspot.com.br/2016/09/a-casa-ao-lado-lll.html

http://contosdacabana.blogspot.com.br/2016/09/a-casa-ao-lado-lv-uma-nova-suspeita.html

http://contosdacabana.blogspot.com.br/2016/10/a-casa-ao-lado-investigacao-continua.html


Um abraço a todos! Obrigada pela visita!!

Cidália

quarta-feira, 12 de outubro de 2016

Revelações ll

No dia seguinte, quando saí do trabalho, lá estava aquela mulher, na praça, sentada no mesmo banco que o dia anterior. Parecia que estava me esperando, porque, quando me aproximei, ela esboçou um leve sorriso. Lembrei que naquela manhã eu não a encontrara pelo caminho. Sentei ao seu lado e pedi que continuasse a contar a sua história. Ela, então, fixou os olhos em mim, deu um longo suspiro e começou a falar.

- Eu estava no fundo do poço, sem saber o que fazer e pensei várias vezes em suicídio. O Antônio, aquele que eu sempre ignorei por causa dos seu trajes e sua aparência, foi que me salvou. Eu me achava esperta e via beleza aonde não existia. Acabei fechando os olhos para a verdadeira beleza, a beleza interior. São em pessoas como o Antônio, que encontramos o carinho de um abraço e paz numa palavra sincera. Pena que só damos o devido valor quando perdemos esses amigos!
- Antonio trabalhava numa lanchonete e sempre estava  dando conselhos e procurando me ajudar. Fiquei triste quando soube que por minha causa, ele tinha perdido o emprego. O dono da lanchonete não gostava de vê-lo comigo. Muitas vezes ele me dava um lanche e o patrão repreendia-o.

Senti, naquelas palavras, uma imensa tristeza. Percebi que eu dera a ela a oportunidade para que desnudasse toda a angústia que carregava dentro de si.
- O tempo passa para todos e as coisas acontecem de forma diferentes e rápidas, muitas vezes sem nos dar tempo para corrigirmos  nosso erros. Como eu queria poder ter meu pai ao meu lado, contando seus causos e ver a minha mãe rodeada de crianças! Às vezes, fecho os olhos e ouço o som do violão do meu irmão e acabo cantarolando algumas músicas, como se todos estivessem ali comigo.
- Infelizmente, fiquei sabendo que meu pai, um homem justo e trabalhador, que adorava ver a família reunida, não suportou a separação. Começou a beber, logo que ficou sozinho. Perdeu o emprego e passava a maior parte do tempo nos bares da vida, até que acabou morrendo. Minha mãe entrou em depressão e começou a fumar muito. Teve um derrame e ficou numa cadeira de rodas. Não pôde mais lecionar, que era o que mais gostava de fazer. Meu irmão se casou com uma boa mulher e cuida da nossa mãe. Tudo isso que aconteceu com meus pais foi por minha causa. Eles perderam a vontade de viver depois do que fiz.

Meu Deus! - pensei. Quanta desgraça na vida dessa mulher! Quase me arrependi de ter dado ouvidos a ela. Era uma história deprimente. Cheguei a ficar com raiva dela ao saber que causou a discórdia na sua família. Pelo menos o irmão se deu bem na vida. Alguém tinha se salvado, afinal!
Ela ficou por uns momentos pensativa e logo em seguida voltou a despejar as palavras.

- Agora eu estou com trinta anos e aparento ter sessenta. Depois de muitas lágrimas, humilhações e arrependimentos pude perceber como Deus é bom. Ele nos deu uma vida maravilhosa, mas fechamos os olhos e só nos importamos com bens materiais. Só agora  percebo como é linda a natureza, o canto dos pássaros e  o som da água caindo numa cachoeira. A brisa que acaricia nossos rostos parece até ser um carinho de Deus, pedindo para não desistirmos da vida.

Ouvindo  aquela história, continuei curioso e perguntei o motivo do seu sorriso, com tudo de ruim que tinha passado. Ela falou, então, que apesar das escolhas erradas que tinha feito, jamais deixou de acreditar em Deus e no milagre da vida. Contou que depois de tanto tempo, Antônio a encontrara. O amor que ele sentia por ela o levou a uma busca incessante. Ele só descansou quando descobriu seu paradeiro. Ela estava esperando por ele que ficou de aparecer por aqueles dias.

Sem acreditar em toda aquela história, comecei a rir. Pensei que a pobre mulher tinha surtado. Talvez toda aquela trágica história fizesse parte da sua imaginação. Coitada, fazia tanto tempo que vivia perambulando pelas ruas, como numa velha canção, sem lenço e sem documento.
De repente, me espantei! Para  minha surpresa, um homem bem vestido e muito simpático se aproximou, e deu um forte abraço em Patricia. Ela foi tomada por lágrimas que corriam em abundância pelo rosto. Ficaram um tempo abraçados, em silêncio, até que com a voz embargada, ele lhe dirigiu a palavra:

- Querida, vamos para casa, a partir de agora cuidarei de você. Não deixarei que escape novamente de mim. A felicidade te espera! 

Ela levantou-se sorrindo e olhando para mim, falou:

- Esse é o Antônio, aquele que eu achava feio e sem graça. Naquela época eu estava cega, não sabia qual era a verdadeira beleza.

Os dois saíram de mãos dadas, sem olhar para trás, depois do meu aceno. Fiquei parado ali um bom tempo, até vê-los desaparecer como num encanto. Pensei - milagres existem e sou testemunha!

E você, acredita em milagres? Depois de tanto sofrimento, Patrícia dará valor ao amor do Antônio? Será que ela retribuirá esse amor?


O tempo apaga as feridas, mas não um grande amor. A distância separa dois corpos, mas não duas almas.

Sua visita me deixa feliz, muito obrigada!
Beijos,
Cidália.

domingo, 9 de outubro de 2016

A casa ao lado (a investigação continua)


O caso da morte daquele jovem se tornou o assunto preferido naquele bairro. Dona Lúcia, uma mulher tranquila que passava o dia tricotando, não conseguia mais trabalhar. Mal cuidava da casa e fazia a comida.

Vivia com os olhos atentos ao menor movimento que ouvia na rua. Duas casas continuavam fechadas. A casa ao lado e a casa do seu Joaquim.

Já se passara algum tempo e ele ainda se encontrava preso. Até prova em contrário ele era culpado, seria julgado e condenado. Não podia pagar advogado, então teria direito ao serviço de assistência gratuita do estado.

Pobre homem, não tinha ninguém que se importasse com ele. O único irmão que tinha já estava beirando os noventa anos e estava esclerosado. Quem cuidava dele era a mulher, que também tinha lá os seus problemas de saúde.

Dona Lúcia ficou sabendo por intermédio do conhecido que trabalhava na delegacia que a polícia havia descoberto que Roberto, o jovem assassinado, tivera um caso com a filha da dona da mercearia. Algumas dúvidas se instalaram em seu subconsciente.

De repente ela se deu conta de que o assassino não deixa a arma do crime dentro da própria casa.

- Meu bem - disse ao esposo - o que foi que eu fiz? Será que alguém matou aquele rapaz e agora está tentando incriminar seu Joaquim?
- Vamos deixar esse caso para a polícia resolver, mulher. Pare de se meter onde não é chamada.

- Se foi outra pessoa, ela escondeu a arma na casa dele porque o viu lá naquela noite ou porque estava com pressa de se desfazer da arma e a escondeu no lugar mais próximo, na hora da fuga.

- A polícia vai acabar descobrindo, mulher. Já arrumaram um advogado para o réu e ele vai fazer de tudo para inocentar seu Joaquim se ele for inocente.
- Não vou sossegar enquanto esse caso não for resolvido. Se o pobre homem é inocente fui eu que fiz a denúncia. Como vou ter paz se ele for condenado por um crime que não cometeu?

- Você viu ele saindo daquela casa naquela madrugada, encontrou a arma na sua geladeira. Na hora pensou que ele escondera a arma ali porque era um lugar seguro. Quem teria a ideia de procurar numa geladeira? E estava bem escondida dentro do pacote como você viu.
- Isso é verdade, querido. Ele não podia imaginar que eu ia vasculhar a casa dele. Não fazia ideia de que tinha sido visto por mim naquele bendito dia.

Após uma longa conversa com o marido, d. Lúcia resolveu agir sozinha. Deixaria de contar as coisas para seu companheiro. Começou a prestar atenção nos donos da mercearia.

Cada vez que ia comprar alguma coisa dava um jeito de puxar conversa com seu Antônio ou com d. Gertrudes. Ela precisava descobrir alguma coisa. Aquela investigação estava demorando muito. O delegado precisava de uma mãozinha. Seria bem discreta para que não percebessem que estava bisbilhotando.

Numa dessas visitas à mercearia ela ouviu sem querer uma conversa entre d. Gertrudes e seu Antônio.
- O que seu Joaquim foi fazer lá naquele dia?
- Não faço ideia, querido! Só sei que tinha certeza dele ter me visto, foi por isso que fiz o que fiz.

Nesse momento chegou um freguês e d. Lúcia saiu do recinto sem ser vista. Sua mente estava a mil! Na cabeça dela o crime já estava solucionado. D. Gertrudes matara o moço e deixara a arma na geladeira do seu Joaquim de propósito. Ao pensar que fora vista por ele, tomara essa decisão para incriminá-lo.

Na clínica, Eloísa estava refletindo sobre a sua vida. Quando estava metida com aquela turma, chegou a pedir dinheiro para um dos vizinhos para comprar drogas. O pior, foi que o vizinho tornou-se abusado. Deu o dinheiro a ela e depois começou a persegui-la e foi assim que descobriu  seu namoro com o Roberto.

Desde que chegara ali, Eloísa não soube mais notícias do namorado. Se sua mãe tivesse entregado a carta, ele teria ido visitá-la com certeza. Roberto tinha feito alguns inimigos e muitas vezes tinha que ficar um tempo afastado para tentar se proteger. Talvez fosse por isso que ele não fora visitá-la. Ou quem sabe sua mãe não entregara a carta.

Teria que esperar a próxima visita da sua mãe para saber o que estava acontecendo. Será que aguentaria esperar tanto tempo?

Caros amigos, a partir de hoje, vou postar dois contos por semana. Aos domingos e às quartas, pelo menos até finalizar esta história.
Como estou organizando no Wattpad, preciso completar no mínimo dez capítulos.
Estou com outros contos em andamento, graças às ideias que vocês estão me dando.

Agradeço a atenção, o carinho e o apoio de sempre! A cada comentário que leio (perdoem - me a demora em respondê-los), sinto - me mais motivada a escrever.

Um grande abraço a todos!!
Cidália

domingo, 2 de outubro de 2016

Revelações

Certa manhã , eu apressado e atrasado como sempre, esbarrei numa mulher que me cumprimentou  com um sorriso  lindo. Ela estava toda suja e mal vestida. Mesmo assim, com todas as dificuldades que  apresentava, parecia feliz. Respondi o cumprimento com um gesto de cabeça.
No nosso dia a dia, esbarramos em muitas pessoas diferentes. Elas chamam atenção pela beleza, simplicidade, simpatia ou até mesmo pelo mal humor e seriedade. Essa mulher conseguiu me cativar apenas com um simples sorriso. Talvez eu já tivesse passado por, ela algumas vezes, sem notá-la.
Saindo do trabalho encontrei novamente essa mulher. Aquilo me intrigou, seria coincidência? Dessa vez ela estava na praça sozinha. As pessoas que passavam por ela não a enxergavam, mesmo assim, ela continuava feliz. Parecia que nada a afetava. A indiferença daquelas pessoas não a incomodava.
Resolvi sentar ao lado dela e puxar assunto. Senti vontade de saber o que se passava no íntimo daquela mulher. Precisava saciar a minha curiosidade.
Ela, no início, ficou surpresa com a minha abordagem, mas em seguida, falou  que gostava muito de crianças, de observá-las. Quando notava que os pais não deixavam os filhos se aproximarem, ficava triste. Ela não tinha nenhuma doença contagiosa.
Notou que umas moças se aproximavam e ficou em silêncio. Eram algumas amigas que estavam entusiasmadas, porque participariam de um desfile de modas. Todas elegantes e perfumadas, pareciam  modelos profissionais. Logo saíram e como todas as pessoas, não notaram aquela mulher que estava ao meu lado. Até cheguei a pensar que realmente ela não existia, que era uma imagem projetada pela minha imaginação. Olhei para o lado e percebi que ela continuava no mesmo lugar. Ficamos por cinco minutos em silêncio, até que  ela começou a falar e contar um pouco da sua vida:

 - Meu nome é Patrícia. Já fui como essas moças, tive sonhos, amigos e uma infância ótima. Meu pai, um homem sério e justo, brincava sempre comigo, e adorava contar histórias. Eu era a princesinha dele. Tínhamos um pequeno comércio na cidade, a minha mãe era professora, muito amada pelas crianças. Meu irmão tocava violão nas festas de família e eu era sua parceira nas cantorias.

Sem pausa ela continuou o seu desabafo:

- Morávamos em uma pequena cidade chamada Mirantes e foi no colégio Santo Ângelo que tudo começou. As amizades, as brigas, as decepções e os namoros. Ser popular para nós era importante e eu, nos meus quatorze anos, era a  mais bonita e a mais disputada da escola. Entre os meus admiradores estava Antônio. Ele era um rapaz tímido, que por trabalhar até tarde com seu pai, muitas vezes dormia na sala de aula. Era motivo de chacota na sala de aula. Antônio tentava se enturmar, mas para um rapaz pobre e feio era difícil, por isso sempre estava  sozinho. 

Fiquei surpreso, aquela mulher deslanchou a falar, sem dar tempo para que eu assimilasse aquelas informações.

- As festas nos finais de semana era o assunto que rolava na escola, e o meu pai, um homem rigoroso, não me deixava sair.  Eu acabava ficando fora das festas e isso me incomodava; queria sair para me divertir com minhas amigas. Carlos, um jovem rico e bonito, era o cara mais popular do colégio e também  o mais disputado. Ele estava em todas as festas, era o sonho de todas as meninas. A festa dos universitários era a mais badalada da cidade. Todos queriam ir, e comigo não era diferente. O único problema era convencer o meu pai e foi nesse dia que, pela primeira vez,  o respondi.  Não conseguia entender porque tanto cuidado comigo. Eu era jovem e tinha que curtir a vida. Nada me fazia  mudar de ideia e  bolei um plano.  Pulei a janela, enquanto meu pai estava dormindo e me arrumei na casa de uma amiga. Esse plano deu certo e finalmente fui a uma  festa. Tudo era mágico, as luzes, as pessoas dançando, os casais. Fiquei deslumbrada com tudo, e só achei estranho ver minhas amigas trocando de namorado.

Pensei que como fui o único que lhe dei atenção, ela estava aproveitando para desabafar.

- A noite ficou ainda melhor, Carlos se aproximou e fez um elogio. Me senti nas nuvens e entre alguns elogios e carícias, rolou um beijo. Foi então que Carlos me ofereceu uma bebida. No começo recusei, mas preocupada com o que minhas amigas, mais velhas, iriam pensar, resolvi aceitar. Era apenas uma bebida e naquela noite perfeita nada iria dar errado. Depois dessa noite passei a ser convidada para todas as festas, e mesmo brigando com meu pai, eu era presença certa. Carlos sempre chegava mais tarde e fazia com que a minha noite fosse especial. Passei a ser sua companheira oficial. As bebidas  eram constantes nas festas e eu não respeitava ninguém. Meu pai que eu admirava se tornou um estranho; um careta com quem sempre eu discutia. Eu não parava em casa e sempre tinha alguma coisa importante para fazer com minhas amigas. Elas sim, eram minha família, me entendiam e sempre concordavam comigo. Ao lado de Carlos, todos me respeitavam. Através dele conheci um mundo novo e foi com ele a minha primeira vez. Também foi com Carlos que conheci as drogas. Tudo era maravilhoso, as festas, as curtições e os romances.

Disfarçadamente olhei o relógio e ela continuou falando.
- Aos poucos fui perdendo quem me amava de verdade e que realmente era importante para mim. Só eu não via isso, estava cega. Acabei perdendo a minha família. É engraçado como o tempo passa  rápido. Quando me dei conta já estava com dezoito anos. Enquanto para Antônio, meu amigo do colégio, os dias eram lentos. Mesmo entre o trabalho e os estudos, ele achava um tempinho para bater uma bola e fazer alguns cursos. Ele já não era mais aquele menino solitário. O relacionamento com meu  pai se tornou impossível. Minha mãe sempre me defendia e isso acabou causando a separação dos meus pais. Carlos, filho de pais ricos, sempre teve uma vida boa e nunca precisou trabalhar. Usava e abusava de meninas inocentes que se achavam espertas e depois as abandonava como se fossem objetos. Fez isso comigo. Eu estava cada vez mais dependente das drogas e meus amigos foram se afastando. Sem trabalho, sem dinheiro e longe da família tive que me prostituir para manter o vício.

Aquela mulher estava contando toda a sua vida numa avalanche de palavras que saíam da sua boca e se alojavam na minha mente. A noite estava chegando de mansinho, a barriga começou a roncar. Consegui interrompê-la e perguntei se ela estava com fome.

- Não se preocupe, de vez em quando aparece uma criatura abençoada que me dá um prato de comida.

Aquela frase me levou a refletir. Muitas pessoas tem tudo na vida e só sabem reclamar. Aquela mulher já tivera tudo e perdera. Mas, no seu desabafo, em nenhum momento reclamara da sua escolha. Talvez tivesse aceitado aquele tipo de vida que estava levando, como uma punição.
Pedi licença, disse a ela que precisava ir embora. Já era muito tarde e minha família deveria estar preocupada comigo. Prometi que voltaria na tarde seguinte para ouvir o resto da sua história. Ela, então, deu um sorriso e disse:

- Obrigada, até amanhã, se Deus quiser!

Fui embora pensativo. Que vida era aquela? Sem família, sem amigos, sem um teto para morar. Vivendo na rua, dormindo no banco da praça. Aqueles que passam por ela e não a enxergam, vão para suas casas e dormem tranquilos.

Assim como essa mulher, quantos andarilhos carregam dentro de si uma triste história de vida? Qual o motivo que leva-os a viver à margem da sociedade?

Não deixe de acompanhar o desfecho dessa história que será publicado daqui a duas semanas.
No próximo domingo, postarei um novo capítulo da "casa ao lado", que se encontra no wattpad.



Obrigada pela visita e pelos comentários!
Responderei a todos, mesmo que demore um pouquinho.
Beijos,
Cidália.

 Colaboração de P.W.M.