Numa pequena cidade do interior, vivia um casal que, aparentemente, se dava muito bem. Cassiano e Belinda moravam numa casinha simples à margem de um riozinho. Não tinham amigos, apenas alguns conhecidos que encontravam quando iam à feira ou ao mercado. Desde que chegaram ali, há dez anos, viviam apenas para o trabalho, não tinham vida social. Ele era escritor e ela artesã, além de dona de casa. Era um casal sem filhos.
As pessoas sentiam um pouco de curiosidade, mas, não tinham como saber alguma coisa a mais sobre os dois, pois, eram muito discretos. Os únicos visitantes que os viam, de vez em quando, eram o carteiro e uma faxineira. Belinda pouco falava com Rosa, a faxineira e Cassiano mal olhava para o carteiro, apenas recebia a encomenda sem trocar mais de duas palavras.
Num dia chuvoso, de inverno, saíram de madrugada para ir à capital. Cassiano parou no posto para abastecer o carro e o frentista puxou conversa, mas ele foi antipático com o rapaz. Belinda estava com a cabeça encostada no banco, com os olhos fechados. Acordaram muito cedo e ela estava com sono.
Quando os dois chegaram à Capital, se instalaram num hotel simples. Cassiano não queria ser reconhecido, afinal, havia sido um escritor famoso. Estava conseguindo viver no anonimato, porque, no lugar que escolhera para viver, os poucos habitantes não tinham o hábito de ler. O passatempo deles era a televisão e fazia tempo que ele deixara de aparecer na TV.
Assim que entraram no quarto do hotel, Belinda se transformou. Nem parecia mais com a velha companheira dos últimos tempos. De repente, se tornou uma pessoa chata, autoritária e egoísta. Cassiano ficou sem entender aquela mudança repentina. O que estava acontecendo com ela?
– Bel, por que você está se comportando dessa maneira?
– Eu preferia ter ficado em casa, não quero vê-lo rodeado de mulheres.
– Minha querida só nós dois estamos aqui. Não há e nunca houve mais ninguém.
– Pensa que não reparei como aquelas moças da recepção olharam para você?
– Nem notei! Você está imaginando coisas. Só viemos para cá porque tenho uma reunião com o meu agente.
– Por que ele não foi se encontrar com você na nossa casa como das outras vezes?
– Ele não pôde e eu trouxe você comigo para que se sentisse mais segura.
Belinda era uma mulher ciumenta e possessiva. Foi por isso que Cassiano resolveu morar numa cidadezinha do interior do estado. Ele a amava muito e se davam bem quando estavam sozinhos. Enquanto ele escrevia, ela saía para fazer as compras e cuidava dele com carinho.
Já se arrependera de levá-la junto, pois, sabia que aquele final de semana seria um inferno. Ele já passara por isso algumas vezes antes da mudança. Chegara ao ponto de pedir a separação e só mudara de ideia, porque, ela prometera que não faria mais ele passar vergonha diante dos amigos.
Durante dez anos ela mantivera a promessa, pois, viviam longe das pessoas. Chegaram a cortar relações até mesmo com os únicos parentes, uns primos de segundo grau. Esses parentes chegaram a telefonar algumas vezes, porém, Cassiano sempre inventava alguma desculpa para não recebê-los. Cansado das insistências, ele trocou o número do telefone.
Naquela noite se encontraram com o agente e sua secretária no restaurante do hotel. Bastou Cassiano fazer um pequeno elogio à moça para que Belinda virasse uma fera. Levantou-se e foi para o quarto sem terminar seu jantar. Cassiano continuou a conversa e depois que resolveram o assunto sobre seu novo livro, despediu-se e foi para o quarto. Chegando lá encontrou uma mulher transtornada que acabou tirando-o do sério. Ele havia bebido demais e num acesso de raiva apertou o pescoço dela e a sufocou. Não queria ouvir a sua voz. Em seguida, colocou-a na cama e deitou-se ao seu lado.
No dia seguinte, quando acordou e viu que a esposa estava morta, ficou desesperado. Ele não queria ter feito aquilo e também não queria ser preso. Então, a única coisa em que pensou foi ocultar o corpo. Depois que se acalmou, desceu para o café e saiu em seguida para comprar um facão e uma mala.
Cortou o corpo em pedaços e colocou-os dentro da mala. Não deixou nenhum vestígio no quarto. Preocupou-se com os mínimos detalhes. Na saída do hotel quando perguntaram pela esposa, na recepção, ele disse que ela havia saído bem cedo, antes do café, para se encontrar com uma amiga.
Quando ele fez o checkout, não era o mesmo funcionário que os recebera. O moço nem se deu ao trabalho de questionar qualquer coisa. Estava mais preocupado com alguma coisa que via no celular. No caminho de volta para casa, Cassiano parou sobre uma ponte e assim que viu que não vinha ninguém, jogou a mala no rio. Ele tivera o cuidado de deixar o corpo irreconhecível.
Na segunda-feira, quando a faxineira perguntou pela patroa, Cassiano contou que ele e a esposa haviam viajado no final de semana e que ela ficara na Capital para cuidar de uma amiga que estava doente. Rosa acreditou nele, afinal, não tinha motivo para desconfiança.
Ele já tinha tudo planejado. Ficaria ali por mais um mês e depois falaria à faxineira que a esposa pedira o divórcio e ele iria morar no exterior. Diria apenas isso. Talvez, no futuro escrevesse um livro de suspense sobre o assunto.
Não era fácil fingir que tudo estava bem. Precisava ser frio e calculista para manter aquele momento de desatino em segredo. O ciúme exagerado da sua esposa tirava-o do sério, porém ele não queria ter chegado ao extremo. Por que fizera àquilo? Teria que viver com aquela culpa para o resto da vida. Mas, também, não pretendia passar a vida numa prisão.
Durante um mês ele agiu como sempre, como se nada tivesse acontecido. Se a faxineira pedia notícias da patroa, dizia que ela estava bem. Não viu nenhuma notícia sobre o corpo da esposa nos jornais. A correnteza, provavelmente, deve ter levado a mala com o corpo para longe.
Numa certa manhã, quando a faxineira chegou e viu as malas prontas na sala, Cassiano falou que estava indo embora. Iria se encontrar com Belinda para assinar o divórcio e depois cuidaria da sua vida. Não pretendia continuar morando ali sem ela. Ele dispensou a faxineira, fechou a casa e saiu sem olhar para trás.
Rosa, a faxineira ficou olhando para aquele homem que sempre cobiçara e pensou: "que desperdício!"
Será que Cassiano conseguirá viver com a consciência tranquila depois de cometer tamanha atrocidade?
Caros leitores estou me aventurando em mais uma história sequenciada, atendendo alguns pedidos. Espero que gostem e que acompanhem dando suas opiniões.
Muito obrigada pela visita!
Abraços,
Cidália.